Não sei se foi por antiga magia ou tecnologia secreta que Aristóteles veio a dar em Brasília. Queria conhecer a nossa Constituição, dizendo ser hábito seu empedernido. Encontrei-o por azar; expliquei-lhe o básico, alguma bibliografia. E recolhi alguns de seus comentários.
O governo que aqui se vê é uma mescla de oligarquia e democracia, o tipo mais comum de governo constitucional. Não existe nenhum poder ilimitado que subordine os demais; cada qual com sua autonomia e composição definidas pela Constituição.
Compõem aristocracias o Judiciário e o Legislativo, selecionados seus membros entre os melhores do povo. O Executivo, ainda que por tempo limitado, encarna o princípio da realeza. O único componente democrático do sistema encontra-se nas assembléias periódicas que elegem os magistrados (colégios eleitoras). A este governo misto, Aristóteles chamou de "politia" cuja tradução pelo latim, é "república".
Contudo o que mais espantou Aristóteles é o estranho hábito que temos de garantir direitos políticos aos escravos. Calma, prezado leitor: custou-me também entender! É escravo por natureza aquele que não quis ou não pode desenvolver o hábito da escolha prudente, tornando-se assim incapaz de prever. Tal indivíduo necessita da direção de outrem não apenas na política como principalmente no trabalho, estabelecendo um laço de benefício mútuo com seu senhor: este planeja e organiza; aquele provê com sua energia. Note que não é o vínculo jurídico a caracterizar a escravidão, mas sua função: fica evidente que o assalariamento é uma espécie de escravidão por tempo! A questão que mais o perturbou foi a da qualidade da escolha de quem é desabituado dela até na direção de sua vida privada.
Retirado da revista História viva, ano V - nº 58
Autor: Edison Nunes - professor do
Departamento de Política
da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo
e do Programa de Estudos
Pós-Graduados em Ciências Sociais
da PUC - SP.
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